quinta-feira, 21 de julho de 2016

A caixa

Hesitei durante alguns segundos antes de voltar a abrir a caixa.  Abri-a muito cuidadosamente sabendo de cor o seu conteúdo. O relógio dele, aquele que era a sua cara, sóbrio, sensato, robusto e ao mesmo tempo delicado, com bracelete de fino coiro castanho e mostrador doirado. A máquina, essa, parou há três  anos num dia de Julho muito quente e cinzento e cujos ponteiros não mais deram horas desde então. A caneta, gravada com palavras de apreço, oferecida em comemoração e agradecimento por tantos anos de dedicacão e profissionalismo. É  agora minha esta caneta com que ele escrevia as suas palavras naquela caligrafia tão  bem desenhada, tão cuidada e assertiva. Gostava de ter herdado esta sua faceta tão ponderada, tão sensata, mas traçou-me o destino uma natureza espontânea e explosiva que de ponderada não tem muito. E o livro, que me emprestou vezes sem conta, para que também eu aprendesse o que ele já tinha aprendido, cheio de notas escritas com a sua mão, essa, igual á minha mas muito maior, igual no tom de pele, nas sardas acastanhadas e nos dedos bonitos, só que a dele tinha habilidades que nem que eu viva cem anos vou possuir. Fechei e guardei a caixa junto das outras recordações para a voltar a abrir no próximo mês de Julho.

14 comentários:

  1. Dizem que recordar é viver.
    Será que não "morremos" um bocadinho com certas recordações?

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    1. Acho que não Homem do leme. Cada uma destas coisas faz-me sorrir e traz-me á memória imagens e momentos bons. Resolvo bem os assuntos e vou guardando-os em caixinhas. De vez em quando abro uma, sempre as das coisas boas :)

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  2. Que bom GM, ter assim recordações.
    Também tenho algumas, poucas, porque o meu pai, partiu cedo demais, mas guardo fotos e alguns apontamentos dele e tenho-o na minha memória para sempre até que um dia, eu parta também. Saudade custa demais, mas é bom quando há boas lembranças.
    Jinho GM boas férias

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    1. É isso mesmo Nina, lembranças dos momentos bons ajudam na saudade. Beijinho

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  3. Pegar em objectos que têm uma história associada e retirar deles as recordações bonitas que encerram é um exercício tão fascinante. Se quisermos, trazem-nos felicidade. Se não quisermos trazem-nos nostalgia.

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    1. Sim Lápis Roido; cada um vive as coisas á sua maneira. Eu apesar da saudade tenho o assunto bem resolvido, recordo com um sorriso os momentos bem passados :)

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  4. Fazem-nos uma falta danada, não é?


    Beijinho Gaja Maria. Em Dezembro abrirei eu as minhas :)

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  5. Lembro-me muito bem desse dia de Julho. Um beijinho Gaja,e um abraço, daqueles muito especiais.

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    1. Dias que nos marcam Loira, depois habituamo-nos a viver com eles :) Beijinhos

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  6. As férias "aprimoraram" as palavras da saudade. Bem vinda de novo, GM

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  7. Que bonitas palavras a descrever a nostalgia de um dia, de uma vida.

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  8. Que bonito ... Confesso que me emocionei. Beijinho

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  9. belíssima homenagem, gostei pra lá de tanto :)

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