quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Dia 163 - Circunscrita

Caída a noite na cidade, corro pelas ruas empedradas do parque em direção ao patos que dormem com o bico virado para trás e enfiado numa das asas. Não sei porque alguns dormem de pé e outros parecem ainda estacionados dentro de água. O nevoeiro cobre o céu e tudo à minha volta dando um ar fantasmagórico às árvores e uma luz estranha aos candeeiros que iluminam o meu caminho. Nem uma brisa sopra, tudo tão sereno e tranquilo parecendo eu pairar, suspensa no ar daquele momento. Acabei por desviar o meu trajeto para não perturbar a calmaria que me rodeava. Mais à frente vi um gato agachado atrás de um arbusto e ainda uma ratazana à beira do lago a beber água. Só eu estava ali, fora do contexto, respiração ofegante, roupa e cabelo molhados do nevoeiro, o som das minhas passadas a despertar os animais.

Continuei a correr pela pista, atravessei algumas ruas, várias passadeiras, três escolas já vazias em direção ao outro parque. Não o que fica mais distante de casa e onde todos caminham e correm, não. O outro, que também tem patos e pequenos pontos de luz que dão ao lago uma luz difusa e espelhada. Gosto de os verificar assim, já recatados e prontos para a noite, dá-me uma sensação de paz e de esperança para um novo dia.

Aprecio sobremaneira estas minhas corridas solitárias, em que supostamente saio para correr na caixa do nada mas em que o botão do meu cérebro teima em não desligar e vê e pensa e planeia e decide. E enquanto atravesso ruas e praças e parques e vejo janelas com pessoas dentro e carros, só penso que sou o Forrest Gump, a atravessar o mundo e corro e corro e corro... 

6 comentários:

  1. E a sensação de liberdade deve ser tão boa, carago!

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    1. Magui, é o que mais gosto nisto do correr e pedalar, a sensação de liberdade é incrível :)

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  2. Muito bom, gostei de ler!:))
    ~~
    Estranha viagem...
    ~~
    Beijo, e uma excelente tarde

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  3. Corremos para quê? Para nos superarmos? Para provar que estamos vivos? Para gritar, para dentro de nós, que ainda estamos para as curvas?
    Excelente relato, GM. Gostei muito.

    Um beijinho :)

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    1. AC, algumas das razões são nessas, mas há muitas mais. A liberdade, o ar livre, a saúde, o gosto e ou a paixão, a manutenção do esqueleto, etc:)

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