Estou na cama a dormir, tento virar-me e sinto um peso no estômago. Abro os olhos e vislumbro na escuridão o perfil da gata a dormir aninhada na minha barriga. Como terá ido parar ali, não teria ela outro lugar para dormir senão em cima de mim? Eis que a cabeça desperta, prenhe de ideias e frases soltas que se me agigantam querendo ver a luz. É à noite que tudo ganha uma forma dantesca, é à noite, em que está escuro como breu, que tudo nos parece mais sombrio, mais estreito, mais íngreme. Ideias, imagens, cenas soltas, frases feitas passam-me a correr pela mente, agora em completo alerta.
Desde a festa de aniversário de MaisVelho, à secretário no trabalho amontoada de papeis, ao vidro do carro que não abre, a porta da cozinha que não fecha, as lâmpadas que teimam em se fundir por toda a casa, o frigorífico que deita água, a arca onde nasce mais gelo que no Polo Norte e o secador que explode. Depois ainda vem a limpeza para fazer, a roupa para engomar, as ervas do jardim que tenho para arrancar, o leite e o queijo que esqueci de comprar...
Entretanto chegam também os projetos que tenho por concretizar, mais os que tenho ainda por registar, mais os sonhos e as vontades que à luz da noite, ou a falta dela, parece que nunca vingarão.
Finalmente vem o tempo que não tenho, o salário que não estica, o cansaço que se apodera de mim, a coragem que se esvai, a determinação que se esfuma, quais cortinas de nevoeiro que teimam em ficar cerradas, presas na falta de ar da noite.
Tenho calor, tenho frio, tenho sono, estou exausta. Adormeço finalmente e toca o despertador...
Putas das insónias!!