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domingo, 5 de maio de 2019

Ponto cruz

Já fui prendada sim.
Há tanto tempo que já nem me lembro, só quando olho para estes quadros, os únicos que ainda conservo nas paredes, recordo essa fase da minha vida.
Bordei  o enxoval dos meus filhos bebés, fiz quadros, forrei cestos, pintei, decorei com todo o amor e carinho e muitas fitas e lacinhos.
Os bordados já foram substituídos por outro tipo de roupas e de tamanhos muito maiores, os quadros foram substituídos por posters e fotos, os cestos forrados por coleções de latas e isqueiros e bonés e ténis de marca xpto. As pinturas mudaram de cor, as fitas e os lacinhos desapareceram para sempre. E com eles a minha fase mais prendada, ficaram estas borboletas em ponto cruz.
E a palavra Mãe. O beijinho e o abraço de feliz dia da mãe.



quarta-feira, 30 de maio de 2018

Demorei a tomar a decisão, mas afinal também quero falar da eutanásia

Sempre me pouparam às mortes. Viam-me com sensível, impressionável e tudo me causava pesadelos, por isso, sempre eram evitados à minha frente os assuntos  que falassem de sofrimento. Morte era palavra que não utilizavam perto de mim e ir a funerais estava fora de questão até ser adulta. Talvez por isso eu continue a evitar ir, não sei como enfrenta-los, como reagir, como atuar com as pessoas, que sentimentos me hei-de permitir sentir. Posso até dizer que perante tudo isto criei um escudo, uma proteção invisível.
Até que tive de enfrentar o atroz sofrimento de meu pai com uma doença terminal que o levou em três semanas. Foi levando-lhe as palavras, depois o sorriso, depois os movimentos, o discernimento... Até que o levou de vez quando já nem se mexia e nem os olhos abria, já nem sequer gemia. O estranho é que, nos últimos dias dei por mim a pedir a Deus que o levasse o mais depressa possível e o poupasse àquele sofrimento e até hoje tenho remorsos de ter feito aquele pedido a Deus para uma pessoa que eu tanto amava....
O meu escudo não funcionou.

domingo, 22 de abril de 2018

Manhã de domingo

E hoje, após seis dias de treino, resolvi que descansaria as pernas e o traseiro até quarta-feira, dia da partida para a grande aventura. Enquanto desossava o pato, sim, eu hoje estive prendada, desossei um pato inteiro, fiz arroz de pato não muito escondido, pão de ló e morangos com açúcar sem partir nem avariar nada. Posto esta constatação, lembrei-me de que ainda não vira a glicínia de Papai em flor e já era tempo dela. Dele. Limpei de imediato as mãos e corri para o quintal. A caminho, Toni, o gato estrábico de Mamãe enrodilhou-se nas minhas pernas quase me fazendo cair, aquele gato adora-me e dorme à minha porta todas as noites à espera das minhas festinhas logo pela manhã, depois vai à sua vidinha. E foi, mas atràs de mim, claro. Pois que a glicínia já está  em flor e a começar a abrir. O seu perfume está como todos os anos, inebriante e muito intenso. Esta glicínia é mágica, faz-me lembrar pessoas. uma pessoa em especial.... E faz-me tanta falta.

terça-feira, 20 de março de 2018

Compreendo

Compreendo e acho lindas as manifestações de carinho no face, no insta e na bloga. Compreendo as homenagens, os agradecimentos, as fotos com os pais, compreendo a partilha do amor que se sente e se quer expor ao mundo. Compreendo o orgulho dos pais cujos filhos lhes fizeram estas sentidas homenagens. Compreendo quem, como eu, sofra por já não ter o seu. Só não compreendo porque é que o Dia do Pai não é todos os dias...

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Palhacito

Meu pai era um homem demasiado sério. Sério no sentido de honesto, justo e sensato, também sério no sentido de quem carrega o mundo às costas, mundo esse que aparentemente pouco lugar lhe deixava para usufruir das pequenas alegrias da vida, mas acima de tudo, sério, de semblante carregado e riso difícil especialmente no ver de uma criança como eu para quem sorrir e gargalhar era tão fácil. A determinada altura a minha preocupação todas as noites, quando ele chegava do trabalho era fazer os seu olhos sorrirem. Sim, ele sorria com os olhos e se por ventura consegui-se arrancar-lhe um sorriso branco que era quando conseguia ver-lhe os dentes ao sorrir, era o auge, a apoteose da minha performance diária. Foi uma época bastante criativa da minha parte aquela. Eu cantava, dançava, pintava, dizia graçolas, fazia teatros, mímicas, ginástica, tudo. "O canito" de meu pai inventava de tudo por um sorriso. Isto até perceber que de facto a vida era séria demais,

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Para sempre

A cuidar das flores te imagino
Nestes dias de saudade
E sempre que elas florescem
Penso em ti até à eternidade....

terça-feira, 7 de março de 2017

Heranças

Ficou-me de meu pai o gosto à  natureza, ao verde, à  beleza das flores. Ficou-me o gosto de apreciar o plantar para um dia ver nascer e crescer,  coisa que ele fazia nas poucas horas vagas que tinha.
E todas as primaveras tenho o privilégio de o ver sorrir, ainda que em pensamento, de o ouvir chamar-me para me mostrar orgulhosamente o que plantou para mim, para nós. Herdei uma cerca de camélias, um caminho de narcisos amarelos que vão florir lá para  Junho,   uma pérgula de glicínias maravilhosa.  Belos. Tão,  mas tão  belos quanto ele. Um maravilhoso tesouro foi o que eu herdei

domingo, 16 de outubro de 2016

Oitenta



Chega devagar mas decidida, apesar da prótese na anca, no rosto traz as marcas de uma vida. Toda aperaltada, de cabelo pintado e arranjado, a mala a condizer com os sapatos, a aliança no dedo, apesar de viúva. Nuns dias cheia de genica, noutros um pouco amadornada, mas teima em tirar as ervas do quintal, cozinhar, limpar a sua própria casa, até lavar os tapetes e as cortinas. Teimosa que só ela. À revelia pega no carro e vai fazer as suas compras, a sua vida, cada viagem cada risco, as quinas amassadas, o espelho acidentados. Vá-se lá convencê-la a estar sossegada, arranja-se o carro e está já está, diz, ser dependente de alguém é que não.
A mesa cheia de gente plena de amor e de sorrisos, acendem-se as velas, distribui-se o champanhe.
Mamãe, uma guerreira, uma mulher de força e de coragem.
São 80!

quinta-feira, 21 de julho de 2016

A caixa

Hesitei durante alguns segundos antes de voltar a abrir a caixa.  Abri-a muito cuidadosamente sabendo de cor o seu conteúdo. O relógio dele, aquele que era a sua cara, sóbrio, sensato, robusto e ao mesmo tempo delicado, com bracelete de fino coiro castanho e mostrador doirado. A máquina, essa, parou há três  anos num dia de Julho muito quente e cinzento e cujos ponteiros não mais deram horas desde então. A caneta, gravada com palavras de apreço, oferecida em comemoração e agradecimento por tantos anos de dedicacão e profissionalismo. É  agora minha esta caneta com que ele escrevia as suas palavras naquela caligrafia tão  bem desenhada, tão cuidada e assertiva. Gostava de ter herdado esta sua faceta tão ponderada, tão sensata, mas traçou-me o destino uma natureza espontânea e explosiva que de ponderada não tem muito. E o livro, que me emprestou vezes sem conta, para que também eu aprendesse o que ele já tinha aprendido, cheio de notas escritas com a sua mão, essa, igual á minha mas muito maior, igual no tom de pele, nas sardas acastanhadas e nos dedos bonitos, só que a dele tinha habilidades que nem que eu viva cem anos vou possuir. Fechei e guardei a caixa junto das outras recordações para a voltar a abrir no próximo mês de Julho.

quarta-feira, 30 de março de 2016

Amanhã

Não sei bem quando foi que o seu sorriso esmoreceu. Se foi ontem, se foi hoje... Se há dias ou há meses. Talvez o peso dos anos mais o da responsabilidade, o das desilusões, quiçá alguma nuvem que te paire no olhar ou alguma lágrima que não o deixe esboçar.
Dizem que a alegria da juventude se desvanece, que se acumulam os momentos de tristeza e solidão, que o cansaço e a exaustão se apoderam dos corpos e das almas esgotando-os. Não sei no entanto como não vi, eu que sou de ver pessoas. E coisas. No olhar e nos sorrisos, não sei...
Amanhã vou dar-te um abraço.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Nem que passem 200 anos

e um comboio ou vários, haja uma hecatombe, um desabamento, uma explosão, umas mais do que outras, é certo, mas as mães são sempre mães.
Eu também sou mãe, mas hoje venho aqui falar como filha, que com quarenta e tal anos ainda sinto as preocupações, os cuidados, a proteção da minha mãe, como se tivesse sete.
Com setenta e muitos anos, a braços com a sua solidão de viúva recente, com as limitações de saúde que a idade lhe trouxe e com todas as responsabilidades de manter uma casa sozinha, esta mãe galinha, a minha, continua a preocupar-se com as suas pintainhas, mais comigo até e nem sei porquê, talvez porque sou a mais nova, a menos sensata e assertiva, aquela a quem de quando em vez lhe "pára o relógio", e por isso no ver dela, a mais frágil e periclitante, a que precisa de apoio e proteção.
Protege-me, poupa-me, cuida de mim para que não sofra e, quando é inevitável sofrer, minimiza e dá-me força, quando ela própria necessita ainda mais.
Sempre preocupada se cheguei a casa, se cheguei tarde e não tenho jantar, se está tudo bem. Quantas vezes eu chego à noite e tenho à porta de casa uma panela de sopa ou a comida preferida dos meus filhos, ou a minha. Quantas vezes encontro a bacia da roupa apanhada do estendal e dobrada (os nossos quintais são comuns). Enfim, tantas coisas, coisas de mãe que mesmo a precisar de ajuda, se esquece dela em prole dos filhos e dos netos, como sempre assim foi.
E eu pergunto-me inúmeras vezes: Estarei eu à altura de ser filha? Será que um dia estarei à altura de ser uma mãe assim? Estarei eu à altura dos meus anjinhos da guarda?


Não sei o que se passa com as minhas hormonas...